quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

Dos Lábios Azuis





                À medida que adentrava a floresta densa e úmida, na esperança de achar uma saída ou um pouco de luz, sem nem ao menos saber como cheguei ali, a tal floresta ficava mais negra e assustadora. É confuso dizer que tipo de animal fazia aqueles barulhos. Ruídos agudos e ameaçadores vindos de um lado, enquanto do outro, uma gama de sons graves e medonhos, trêmulos e baixinhos, como quem está assustado, à procura de sua mãe. Foi em meio a tal escuro, que fez minha mente pensar em milhões de possibilidades, milhões de imagens que nem sequer existiam, que pude ver a primeira luz. Uma trilha guiada por um ponto fluorescente ao longe. Engasgado com meu próprio pavor, segui-a.
                Aquela luzinha azul fluorescente foi a única luminosidade que vi por um bom tempo, uma luz fraca quase sumindo no escuro eterno e negro. A luz se apagou. E não só o escuro dominou o lugar, como também o frio. Encolhi-me ali no chão, sentindo uma overdose de sentimentos e melancolias que invadiram todos os meus sentidos naquele momento. E todos esses sentimentos se resumiam ao neutro.
                Meus olhos nada enxergavam.
                Meus ouvidos nada escutavam.
                Minha língua só sentia o amargo da própria boca.
                As narinas não sentiam nada.
                A pele só se sentia gelada.
                Foi quando, em fração de segundo, todo o nada que me dominava se preencheu. Meus olhos se encheram de luz quando vi toda a floresta iluminada de neon. Árvores com folhas coloridas e troncos que escorriam seiva fluorescente. Meus ouvidos foram invadidos pelo coral em ópera dos pássaros neon multicolores, trajados, estranhamente, de ternos azuis e gravatas pretas. Minha boca agora se sentia alegre e doce. O cheiro de vida era tão impactante quanto o calor que agora me tocava de leve. Parecia o efeito de alguma droga alucinógena, uma espécie de viajem psicodélica e multicolor.
                Ainda assim, com toda luz e as sensações boas e orgásticas que eu sentia, senti medo. Muito medo. Talvez mais do que antes. Aquilo tudo era desconhecido para mim, um universo novo e fantástico, onde a realidade não parecia bem vinda. Senti-me tão só em meio a tanta vida. Tanta cor.
                Girei. Girei em busca de algo, um caminho, alguém. E achei, em uma de minhas viradas frenéticas, alguém que logo me roubou o olhar. Encostada ao pé de uma enorme árvore, uma garota. Pele branca, cabelo claro. Olhos castanhos e lábios azuis. Parecia ter uns 13 ou 14 anos. Seus lábios azuis fluorescente pareciam ter brilho próprio, não parecia batom, pareciam naturais.
                Ela me fitava fixamente, fato que só fez aumentar meu medo e angústia. Dei um passo para trás e então fiquei parado, imobilizado, por algum motivo. Queria sair correndo, aprofundar-me ainda mais na mata escura que estava antes. Queria sair daquele mundo neon. Não consegui.
                Fiquei ali, paralisado por um tempo, enquanto ela, parada em seu canto também, ficava olhando para mim. Parecia me estudar, querer entender algo que era estranho para ela. Enquanto isso os pássaros, enfiados em seus terninhos engomados, cantavam alguma canção com notas altas, realmente muito altas, daquelas que quebrariam copos. Os olhos da menina passavam por todo meu corpo nu no mesmo ritmo da canção. “Quanto tempo fiquei ali?”
                Já me sentia confortável após tanto tempo parado. Foi estranho quando, sem motivo ou explicação, as luzes coloridas e fluorescentes começaram a se escurecer. Tudo começou a se afogar no escuro. As árvores, os pássaros, a menina, eu.
                E então voltamos à mesma cena.
                Meus olhos nada enxergando.
                Meus ouvidos nada escutando.
                Minha língua só sentindo o amargo da própria boca.
                As narinas não sentindo nada.
                A pele se sentindo gelada.


BUDDA

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