segunda-feira, 1 de julho de 2013

Do Pó ao Póstumo (O Homem Errado #3)



Sniff...
A última fileira de pó entrou narina abaixo, e naquele momento ele quis estar em casa. Não na casa onde morava, aquele apartamento caindo aos pedaços que pagava há cerca de seis meses; ele queria estar em casa; a casa onde nasceu, cresceu... A casa da qual um dia se esqueceu. Mas acabara de se lembrar. E por um descuido, foi longe demais. Deixou-se levar muito fácil. Não tomou cuidado com a mente, então chegou ao fundo... O fundo da memória.
Era como um quarto escuro; sem paredes, janelas ou chão. Ainda assim, sentia que estava sobre algo quente e úmido; algo que lhe fazia lembrar sua mãe. “Como era mesmo o nome dela?”, “Como se isso importasse!”. Ele estava encolhido. Sentia-se fraco e prepotente; assim como se sentira durante toda sua vida, mas nunca demonstrou para ninguém além de si mesmo. Talvez por nunca ter tido ninguém. Por nunca ter sido alguém.
Mas mesmo não tendo sido alguém, o rapaz foi longe. Notas de cem não eram novidade para os seus bolsos. Assim como a cocaína não era estranha ao nariz. Mas dessa vez ele extrapolou, entrou na área escura da mente. O lado que não pode ser visto com os olhos, mas com o tato.
Então tocou a superfície na qual se encontrava. Sentiu amor, sentiu-se seguro e quente. Sentiu como se fosse um menino; Sem medo de aprender, de errar. Sentiu-se inocente e, por um segundo, quis manter-se assim. Quis ter podido seguir o caminho certo. Mas ele não podia mais. Ele errou. Seria sempre um homem errado.
—Cadê você, seu merda!
A voz forte e agressiva seguiu o barulho da porta sendo arrombada com o corpo pesado. Ele acordou de seu delírio, ainda assim sem lucidez; enxergava tudo aos borrões e não fazia questão de se mover. Continuou debruçado sobre o pó branco na mesa da sala.
—Então você acha bonito não pagar pela droga dos outros, é? —Ecoou a voz.
—Eu não sei quem é você... —Disse, sem se mexer sobre a mesa, com a voz mole.
—O que? Não sabe quem eu sou? Olha pra mim, filha da puta!
—Você é minha mãe? Se não for, pode ir embora... Eu quero minha mãe.
—Sua mãe? Eu vou te mostrar o caminho para encontrar sua mãe.
—Minha mãe morreu.
—Ótimo!
Não houve muito além disso. Só o erguer da arma que já estava empunhada, o puxar do gatilho e o “Poow!”. Nada além.
Só o sangue errado.
Do homem errado.
Na mesa errada.
No esconderijo errado.
Sobre o pó errado.
O caminho errado.

E é tão estranho falar de si mesmo na terceira pessoa...


BUDDA