domingo, 12 de maio de 2013

O Prólogo (O Homem Errado)





            - Onde é que eu to?
            Meus passos apressados ecoam em ruas desertas. “Onde eles estão? Todo mundo! Para onde foi todo mundo?”. De fato, o que todos disseram durante todos os dias da minha vida estava certo: há algo de errado comigo. “Como cheguei aqui? Por que cheguei aqui? Por que aqui?” É o ecoar de tudo o que há em minha cabeça neste exato momento. “Sou eu? Quem sou eu?”
            Os postes brancos e brilhantes iluminam a noite fria e quieta na qual eu vago. Eles são minha única companhia, uma vez que a lua também me deixou. O terno amarrotado de tanto andar e correr por essas ruas, em busca de qualquer coisa, qualquer sinal. Em busca de respostas, ou melhor, em busca das perguntas que nunca fiz no caminho até aqui. A gravata frouxa, rosto suado. Sinto meu cabelo, antes penteado para trás, cair sobre meu rosto. “Por que minhas mãos estão presas?”, acabo de notar a fita cinza amarrada em meus pulsos, prendendo um ao outro; São resistentes, difíceis de tirar, mas nem me preocupo com isso, tenho pensamentos demais para decifrar.
            Eu poderia gritar, e grito.
 Nada além do ecoar da minha própria voz entre os prédios. “Onde estão os carros? Onde está minha maldita cidade?”. Não há nada além de mim. Nada além do homem errado.

- Onde é que eu to?
Grito mais uma vez, sem esperança de resposta. Por que ainda estou correndo sem direção? Uma vez que sei que não encontrarei nada. Cansado, jogo-me na beira da estrada. Olho para o céu. Não há estrelas. Fico calado, ouvindo minha respiração. Ouvindo os próprios pulmões ofegantes ecoando nos prédios da metrópole. “Quem sou eu? Quem sou eu?”. Não que eu não saiba quem sou eu. Só queria saber se de fato sou eu. Se este era meu destino. Se o caminho que tomei era o meu. Talvez eu tenha errado, pegado o caminho de outro. Talvez eu esteja no lugar de outro.
Talvez eu tenha nascido no lugar de outro.
Na casa de outro.
Com a família de outro.
Talvez eu tenha tomado as decisões de outro.
O sucesso de outro.
Talvez eu seja outro, diferente do que era para ser.
Talvez haja outro em meu lugar.
“O que diabos aconteceu?”

Mas, pensando bem, tomar o caminho de outro não me fez tão mal. Mesmo que tenha feito de mim a “ovelha negra” da família, levou-me à um bom futuro. Eu tive sucessos e realizações. Fiquei rico. Mais que rico. Eu me tornei uma espécie de Rei. 
Talvez um Deus.
Fico imaginando o que teria acontecido se eu tivesse nascido na casa certa. Sem as desgraças que tive. Sem o “visitante”. É provável que tudo tenha acontecido ao contrário. Eu teria nascido em uma família rica, seria um homem de sucesso até certa idade, e depois, fracassaria. Eu seria um ninguém. Não teria dinheiro, mulheres ou fama. Talvez eu estivesse lecionando português em uma escola onde nem os outros professores me respeitariam. Seria motivo de piada para os alunos. Assim como foi minha vida antes de eu me tornar o que sou.
Mas talvez eu tenha nascido no lugar certo. Com os descendentes certos. Com o signo certo, não que isso importe. E talvez tenha dito as palavras erradas para a pessoa errada que me deu conselhos errados. Que me tornou a pessoa errada. O sucesso tem cheiro de puta cara, daquelas que você se apaixona se não souber que é puta. E eu não sabia. O maldito visitante não disse. Ele deixou eu me apaixonar. Convenceu-me a tomar a estrada errada, na direção errada, com as intenções e idéias erradas. Ele fez eu me apaixonar pela puta errada, na esquina errada, com a camisinha errada.
Mas de que vale tudo isso? Por que digo tudo isso? Uma vez que meu fim é bem semelhante aquele começo. Eu, sozinho.
Talvez eu tenha o sangue errado.
Os genes errados.
Os talentos errados.

Talvez eu seja o homem errado.
Com o destino errado.
No terno errado.
Na rua errada.

Talvez eu esteja errado, mas é mais provável que eu só esteja no plano errado. 
E acho que não dá pra reajustar.



Matheus Menegucci - Budda