sexta-feira, 9 de novembro de 2012

Duas Baleias e Quatro Versos Insignificantes



        Em meio a bagunça podemos destacar algumas coisas, além das milhares de peças de roupas espalhadas pelo trailer, como uma coleção de discos esparramada sobre a cama, um poster do Frankenstein meio enrolado sobre a mesa, e sobre ele, uma xícara fria de café. A pequena janela só deixava entrar algumas frestas de luz. Era estranho ficar de pé, parecia que o trailer estava flutuando, e de fato, estava.
        Foi realmente bizarro quando algumas peças de roupas começaram, lentamente, a flutuar, levantavam voo devagarinho, de repente alguns objetos, como a coleção de discos, também saíram do repouso e começaram a perder a gravidade. Demorei para perceber que as coisas não estavam voando, e que na verdade, o trailer estava caindo. Logo eu também flutuava, na mesma posição que estava, sentado, sem me importar. Assustei quando, bruscamente, pousei na cama, e todo o resto que flutuava também pousou. De repente a água começou a invadir o trailer violentamente, pelas frestas e buracos na lataria. Continuei do mesmo modo, observando, rindo, admirando a invasão da água em meu recinto.
        Demorou um pouco, mas logo a água já havia chegado ao teto e, consequentemente, o trailer afundava. Então, pela primeira vez, me movi, fui até a janela e observei o oceano, me devorando, me engolindo. Vi peixes, plantas e baleias... Ah! As baleias, cantavam com tanta naturalidade, a cantiga relaxante e ensurdecedora que só elas sabiam cantar. Haviam duas, uma adulta, outra filhote, mãe e filho. Nadavam bem devagar, como quem não se preocupa com nada, "como eu queria ser uma delas!"
        E elas cantavam...

"No fundo...
O escuro...
Um filho...
Prematuro..."

        O que aqueles versos significavam? Eram direcionados à mim? Fazia sentido, uma vez que minha vida se resumia ao escuro e a escolhas impensadas e precipitadas, ideias prematuras jamais realizadas. O que as baleias queriam me dizer? Não tive tempo, a água me puxou de volta e eu acordei... Seco, na terra, sem vida, sem resposta.


BUDDA

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