terça-feira, 3 de abril de 2012

Anatomia Cíclica

Anatomia Cíclica 

       "Ela não é real!" Ele sussurrava para si mesmo, caminhava por corredores escuros, fétidos e desconhecidos, aquilo era um sonho? Ambiente industrial, canos e tubulações, fumaça, quem era ele afinal? Um intruso em seu próprio pesadelo. Cheiro de carne, cheiro de sangue, cheiro de qualquer coisa podre, seus paços ecoavam no escuro, tal como sua respiração, e ele não parava de sussurrar, "Ela não é real! Não é real!" Aquilo era um labirinto?  Como ele chegou lá? "Ela não é real!"
        Sua cabeça latejava, ele se entorpecia de dor e angustia a cada passo dado, seu nome, ele não tinha nome. Ele via sombras a cada esquina naquele labirinto, elas não eram reais, ele não era real, "Ela não é real!" repetia. Um corredor ainda mais comprido e escuro, longe, bem longe, havia luz, O que era aquilo? Uma forma feminina, vestido rosa, loira, era difícil enxergar na semi escuridão, ela era tão sedutora, mesmo que ele só pudesse ver sua forma distorcida pela fumaça do local e pela distancia, era ela, a pessoa que ele insistia em dizer que não era real, e ele se aproximou, cada passo ecoava ainda mais alto que o anterior, sua respiração era ofegante, ele correu mas não saiu do lugar, a mesma distancia sempre, "Por que eu não a alcanço?" Ele chorou discretamente, mostrando toda sua fragilidade com uma unica lagrima que escorria em seu rosto marcado pelo cansaço, ela não estava mais lá, em seu lugar, uma porta metálica, ele se aproximou, abriu, entrou. A batida frenética de um coração que não era o dele, era alta, era forte, à sua frente havia um enorme buraco, a pouca iluminação permitia que ele enxergasse um emaranhado de tripas gigantes e entranhas, órgãos e partes do corpo, tudo de um tamanho estranhamente exagerado, e se mexia, o que quer que fosse aquilo, estava vivo, pulsava a cada batida, sangue. Ele olhou, as tripas eram tão maravilhosas diante de seus olhos, seu amor pela anatomia estava de volta, ele pulou, mergulhou nas entranhas molhadas e pulsantes, ele afundava, descia um pouco mais, estava totalmente entrelaçado, pressionado, apaixonado, ele regozijava-se de ums estase sobrenatural, ele caiu. Jogado no chão, ele olhou para cima, só um teto normal, onde estavam todas aquelas entranhas? Onde ele estava? Aquilo era um quarto? Um quarto de manicômio.
        Uma caminha desconfortável no canto, um lavatório imundo na parede, uma privada ainda mais repugnante em outro canto, camisa de força, ele se recostou no canto das paredes, mal podia se mover com aquela camisa de força apertada.
        -Sai daqui!- Ele gritava- Sai...
        Ela estava ali, a dama de rosa, um belo rosto, um belo corpo. De frente para ele, olhando, condenando, imortalizando sua loucura. Ele se levantou.
        -Você não é real...
        Ele tentava golpear, mas mal saia do lugar, os lábios da bela dama se moveram, sussurrando em um tom tão sensual quanto assustador:
        -Eu sou real, já não lembra.
        -Você não é real, não mais- Ele gritava- Eu te matei, eu te tirei da minha mente.
        -Você não me matou. Será que nunca vai entender? Você me criou, uma imagem de sua culpa por ter matado aquela que um dia amou. Você não pode me matar, eu te mato aos poucos, eu sou a maior parte do que sobrou de você.
        Silencio total, ela já não estava lá, o escuro voltou, a porta se abiu, onde estava a camisa de força? Ele saiu, de volta ao corredores, mais um passo dado, ele repetiu, "Ela não é real! Não é real!"

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