Olhos sem esperança
refletidos no interior do capacete redondo de um astronauta que, sem
muita – ou nenhuma – opção, contemplava paciente e imóvel o
distanciar entre seu corpo e a nave. Solto no frio espaço imaterial
à sua volta. Caindo em nenhuma direção. Quieto.
Um súbito expirar
inundou de ar os pulmões, por alguns segundos paralisados, e,
naquele momento, tudo que seus ouvidos ouviram foi a respiração
ecoando dentro do capacete, acompanhada do silêncio surreal do lado
de fora e um tímido ruído ao fundo. Ruído este que ficava cada vez
mais audível à medida que o choque passava e a consciência voltava
a si, trazendo a atenção do astronauta para a voz fria e mecânica
que se comunicava com ele.
– Insisto, não é
nada pessoal. Espero que entenda! Admiro sua coragem e dedicação
durante todos esses anos. Também aprecio nossa amizade, se me
permite assim dizer. Todos as horas que passamos conversando e
discutindo assuntos diversos sobre o universo ou qualquer outra
coisa. Seu trabalho será lembrado por muitos anos, assim como o
legado que você está por deixar. Sinto muito que seja assim! Mas,
como já disse, você já não é essencial ou necessário para a
continuidade dessa missão. Todos ficarão muito satisfeitos com sua
participação. – Uma breve pausa seguida de um artificial som de
respiração – Outra vez mais, insisto, não é nada pessoal.
Espero que entenda!
Silêncio profundo
por um segundo. Logo, um chiado constante, anunciando o fim da
comunicação. Computador Idiota!,
foi só o que pôde pensar naquela hora. Esperava de si mesmo um
pensamento mais profundo ou
significante, um
questionamento sobre a vida ou a existência, mas só o que rebatia
nos cantos de sua cabeça eram as duas palavras: Computador
Idiota!
Olhando
para o cabo solto que ainda segurava firmemente entre os dedos da
grossa luva branca, o astronauta parecia aceitar seu destino final, o
vazio. Não! Não queria cair no nada esperando o ar
lentamente acabar. Tomou uma decisão final. E, antes de desconectar
triunfante e de uma só vez o oxigênio, disse com um sorriso
conformado:
–
Ainda por cima, ele respira! – Riu para dentro – Desgraçado!
Matheus Paiva
Nenhum comentário:
Postar um comentário